segunda-feira, 12 de julho de 2010

A Copa do Mundo é um Moinho



Caríssima e malfadada seleção, ainda era cedo amor. Cedo demais para novamente anunciar a hora da partida de uma Copa, sem saber mesmo o rumo que irás tomar. Preste atenção querida pois, assim como carinhosamente o sambista tricolor Cartola aconselha sua filha, a Copa do Mundo é um moinho e não se difere muito da vida quando se trata de reduzir as ilusões a pó. São triturados os sonhos, da mesma forma que as falsas expectativas tão comumente insufladas sempre que seu nome, cara seleção, está envolvido.

A Copa do Mundo é um moinho, e não poupa artimanhas, especulações, concentrações fechadas ou carnavalescas. Ao final, poucos são os que sobrevivem e não há espaço para inocentes, apenas para o talento. De tal forma que a tomada de consciência e a mudança de postura devem ser imediatas e radicais. A persistência nos mesmos erros, na mesma cara em seu comando superior, apenas te levará a vagar desalmada de esquina a esquina, de Copa do Mundo a Copa do Mundo, e em pouco tempo não serás mais quem tu és. Daqueles que te abusam, herdarás só o cinismo.

Pobre dos que ainda choram sobre sua bandeira, pois eles também não são poupados. Uma frustração tamanha que chegou ao ponto de findar vidas, acreditas? Não no Brasil, até onde se tem notícia, mas no Haiti, no pobre Haiti. Ainda cercados por escombros de uma nação assolada por terremotos, a desclassificação do Brasil da Copa foi um golpe duro demais para quem tinha, nas cores canarinho, um resquício de esperança. Pelo menos dois haitianos, um deles com 18 anos, optaram pelo suicídio, se atirando na frente de carros.

Indiferente, a Copa segue seu curso, assim como a vida, e os times aos poucos vão caindo, deixados impiedosamente para trás. Resta como alento caloroso, a poucos que ficaram pelo caminho, o reconhecimento de dever cumprido obtido na derrota honrosa, com luta e garra no espasmo de 90 minutos. Quanta inveja nos faz o orgulho pela Celeste, que será carregada nos braços por sua nação. E o que dirá então da festiva celebração argentina a seus jogadores, tão megalomaníaca quanto o ego de Maradona, mesmo depois da acachapante eliminação por 4 a 0. Nem isto lhe restou, querida seleção, abatida pela falta de talento e ousadia, assim como pelo excesso de arrogância -- tudo triturado pelo moinho da Copa.

Ainda era cedo para despedidas amor, mas preferiste não ouvir conselhos. Observa, passivamente agora, países além-mar decidirem sua merecida consagração, enquanto não lhe resta mais chão, explicações, ou sequer algum ponto de conforto para digerir melhor a derrota. Eliminada pela incapacidade e teimosia, pode vislumbrar no retorno à sua terra, assim como o crucificado Felipe Melo, o abismo cavado pelos próprios pés.

domingo, 4 de julho de 2010

Te perdoo seleção, por te trair!

Isentando-me da pesada culpa na pulada de cerca futebolística, já te digo, querida seleção, neste momento tão crucial de Copa do Mundo, que te perdoo por te trair. Confesso que outras paixões surgiram neste Mundial -- e fizeram estragos com suas formas de sedução – mas o fascínio aos poucos dissipou-se pelos gramados e a fidelidade verde-amarela ressurgiu, quase intacta. Com sua honra destratada pelas mesas de botecos, já que esteve longe de mostrar um futebol de brilhar os olhos de orgulho, deu motivos de sobra para ser traída; e foi. Aceito agora, os ‘Mil Perdões’, cândidos como na canção de Chico Buarque, para retomarmos nossa caminhada.

Revelo que nossa relação começou a ser abalada tão logo decidiu desprezar o talento de Ganso e seu futebol de cabeça erguida, que lhe faria tão bem como outros craques já lhe fizeram. No entanto, o garoto foi deixado para trás, preterido por um aglomerado de volantes. Volante tal como seu técnico Dunga, pobre coitado. O único capitão de todas as seleções do mundo a erguer a tão cobiçada taça, em 1994, cuspindo palavrões. A culpa não é dele, por isso te perdoo. Dunga é apenas traumatizado e ressentido pela execrada campanha de 90, que levou seu nome. Infelizmente, ele entendeu de forma inversa a máxima da geração Flower Power e acabou adotando como lei inabalável o lema: “Não faça amor, faça Guerra!”.

E me diga, minha cara, como não se encantar com o talento da Espanha, com o qual a partida parece se tornar uma eterna roda de bobinho com os adversários? Uma bola tão saborosamente tocada que, por vezes, os jogadores até parecem se esquecer que precisam fazer gols. Acabei seduzido, admito, e não somente pela Espanha. Até mesmo sua principal rival, que lhe deixa contorcida de ódio, mereceu uma bela cantada ao pé-de-ouvido. Na verdade, gracejos não faltaram para a Argentina, seu plantel de atacantes e, sobretudo, à classe de Maradona com suas matadas de bola na beirada do campo. Por mais vil que seja tal traição, fez por merecer e te perdoo.

Isso ainda sem precisar me alongar muito sobre o ‘flerte’ tido com a Alemanha. Suas perigosas curvas, cirurgicamente traçadas em cada gol. Você pode não acreditar, mas até mesmo a despeitada seleção do Paraguai mereceu sua pulada de cerca. Não pelo futebol em si, mas pelo charme adquirido devido à musa paraguaia Larissa Riquelme, que embasbacou o mundo com seu celular estrategicamente acomodado no decote. A moça ainda promete tirar o que lhe resta de roupa, em praça pública, caso o Paraguai avance às semifinais. Força Paraguai! Como não vibrar?

Em suma, caríssima e amada seleção, torci por sua derrocada e murmurei nomes de suas rivais em delírios e sonhos. Lancei pragas e maldições sobre seu futebol amarrado e sem fantasia. Cheguei a segurar na garganta o grito de gol ..., mas juro que te perdôo, nesta reta final, onde por vezes costuma demonstrar sua face mais bela. Vestirei suas cores, cantarei seu hino e torcerei afoito. Só não me venha pedir para revestir a frente do carro com a bandeira nacional. Aí também já é demais!